PEÇA PROCESSUAL: AÇÃO CIVIL
PÚBLICA DA ISENÇÃO DE TAXA DE CONCURSO DO MPU
Excelentíssimo(a) Senhor(a)
Juiz(íza) Federal da _ Vara Cível da Subseção Judiciária de São Paulo
PAJ n" 2006/020-33672
A
DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO,
instituição essencial à função jurisdicional do Estado, a quem incumbe a orientação jurídica e a defesa, em
todos os graus, dos necessitados, representada pelo subscritor, vem, com
fundamento no art. 5°, LXXIV e XXXV, e no art. 134 da Constituição da
República, no art. 4°, III, da Lei Complementar 80/94, no art. 82, III, do
Código de Defesa do Consumidor, c.c. art. 21 da L. 7.347/85, ajuizar a presente
AÇÃO
CIVIL PÚBLICA, COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA,
Em face (i) da UNIÃO FEDERAL, com
endereço na Av. Paulista, 1842, 30° Andar, edifício Cetenco Plaza - Torre
Norte, em São Paulo/SP, (ii) e da FUNDAÇÃO CARLOS CHAGAS, com endereço na Av. Prof.
Francisco Morato, 1565, Jd. Guedala, em São Paulo/SP, pelas razões que passa a
expor.
1. Dos fatos
Em 23 de outubro de 2006 foi publicado
o Edital PGR/MPU n° 18/2006, edital de abertura do V Concurso Público para
provimento de cargos das Carreiras de Analista e Técnico do Ministério Público
da União.
As inscrições podem ser feitas
por meio da Internet, no período de 4/12 a 21/12/2006, até às 20h30min (horário
de Brasília) ou nas agências credenciadas da CAIXA - Caixa Econômica Federal,
relacionadas no Anexo IV do referido edital, no período de 4/12 a 22/12/2006,
em seus respectivos horário de expediente bancário, conforme o item 2 do
Capítulo IV do edital.
Não foi prevista nenhuma forma de
isenção de taxa, como expressamente se extrai do item 3.1.3 do Capítulo IV (Das
inscrições):
"Não haverá isenção de
pagamento do valor da inscrição, seja qual for o motivo alegado".
Dessa forma, inviabiliza-se a
participação no concurso e a consequente possibilidade de acesso a cargos
públicos de milhares de pessoas hipossuficiente " • e não têm condições de
arcar com os custos da taxa sem prejuízo do próprio sustento.
Por óbvio, não se quer discutir a
legalidade da cobrança de taxa para a criação em concurso público. O que se
quer é garantir àqueles que não têm condições de arcar com as taxas de R$ 60,00
(sessenta reais) para o cargo de alista e R$ 45,00 (quarenta e cinco reais)
para o cargo de técnico, sem prejuízo subsistência familiar, não sejam alijados
da participação no certame.
2. Da legitimidade da Defensoria Pública
A Defensoria Pública tem por
função institucional a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos
necessitados. É instituição essencial à função jurisdicional do Estado
justamente por garantir o direito fundamental à assistência ~ 'dica integral e
gratuita aos necessitados, conforme assegura o art. 5°, LXXIV, Constituição
Federal, umbilica1mente ligado ao direito fundamental do acesso à justiça,
consagrado no art. 5°, XXXV, da CF.
Nesse sentido, não há instituição
que represente tão adequadamente os hipossuficientes que a Defensoria Pública.
A ideia de representatividade adequada é inerente ao reconhecimento da
legitimidade para o ajuizamento de demandas coletivas. É o que se infere do rol
de legitimados previsto no art. 82 do CDC, aplicável à defesa de qualquer
interesse coletivo por força do art. 21 da L. 7.347/85.
Destarte, a Defensoria Pública da
União, entidade da administração pública federal direta sem personalidade
jurídica, especificamente destinada à defesa dos interesses e direitos dos
necessitados, por força da conjugação entre os arts. 82, III, do CDC e 21 da
Lei de Ação Civil Pública, é parte legítima para propor a presente demanda.
Não reconhecer a legitimidade
ativa da Defensoria Pública para propor ação civil pública seria inviabilizar o
próprio acesso à justiça daqueles que não têm condições econômicas de
representar-se em juízo.
Note-se que, em relação ao caso
presente, três pessoas já procuraram a Defensoria Pública da União, buscando a
assistência jurídica desta instituição para pleitear a isenção da taxa de
inscrição, como comprovam os documentos anexos. Os irmãos W. G. A. JR. e G. M.
A. foram atendidos em 11.12.2006, originando o Processo da Assistência Jurídica
(PAJ) nº 006/020-33575. C. C. s. foi atendida em 11.12.2006, originando o PAJ
n" 2006/020-33576.
3. Do
direito
O livre e amplo acesso aos cargos
públicos é garantido, como direito fundamental, pela Constituição da República,
em seu art. 37, I, verbis:
"Art, 37. A Administração
Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, Estado, Distrito
Federal e Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
I - os cargos, empregos e funções
públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos
estabelecidos em lei como aos estrangeiros, na forma da lei".
Como se deflui do art. 11 da L.
8.112/90, é possível a cobrança de taxa . inscrição em concurso público:
"Art, 11. O concurso será de
provas ou de provas e títulos, podendo ser realizado em duas etapas, conforme
dispuserem a e o regulamento do respectivo plano de carreira, condicionada inscrição
do candidato ao pagamento do valor fixado no e . quando indispensável ao seu
custeio, e ressalvadas as hipótese de isenção nele expressamente previstas".
(Grifo nosso).
Resta claro, pois, que, ainda que
seja possível a cobrança de taxa para a inscrição no concurso, tal taxa não
pode impedir o acesso dos hipossuficientes aos cargos públicos, já que o mesmo
dispositivo que permite a cobrança também prevê a necessidade de regulamentação
das hipóteses de isenção, única interpretação possível à luz do princípio
constitucional do amplo acesso ao cargos públicos.
Aliás, tratar igualmente
desiguais é inviabilizar o princípio da isonomia, consagrado no caput do art. 5° da
Constituição Federal. Vedar qualquer hipótese de isenção de taxa para inscrição
no concurso é impedir que aqueles que não tenham condições de arcar com o custo
vejam-se privados da possibilidade de concorrer aos cargos públicos. No caso, o
discrímen necessário para emprestar ao princípio da igualdade todo o seu
conteúdo é a isenção para os hipossuficientes, cobrando-se, eventualmente, taxa
apenas daqueles que possam pagá-la sem prejuízo do sustento seu e de sua
família.
Note-se, ainda, que a previsão de
isenção de taxas é regra nos editais para concurso de Procurador da República,
como se observa nos editais para o 22° e para o 23° Concurso Público para
Provimento de Cargos de Procurador da República, em anexo. Não se mostra
plausível, portanto, que no caso de concurso para os cargos de analista e
técnico do MPU tal previsão não seja feita.
4. Da
antecipação da tutela
Presentes, no caso, os requisitos
para o deferimento da tutela antecipada.
O fumus bani iuris está
fundado no direito fundamental ao amplo acesso aos cargos públicos, insculpido
no art. 37, I, da Constituição da República. A concessão da medida permitiria
àqueles que não têm condições de arcar com os valores da taxa de inscrição
possam concorrer aos cargos de analista e técnico do MPU, sem prejuízo do
sustento de seu núcleo familiar.
O perigo da demora do provimento
jurisdicional é facilmente verificável ante a iminência do término do período
de inscrições, que se encerram em 22 de dezembro de 2006. Caso a tutela
não seja antecipada, corre-se o risco de inúmeros potenciais candidatos
deixarem de inscrever-se no certame unicamente em razão de não disporem dos
recursos financeiros para o pagamento da taxa.
Assim sendo, requer-se seja
concedida liminar inaudita altera pars para antecipação da tutela
pleiteada, nos seguintes termos:
a) determinar à União Federal e à
Fundação Carlos Chagas que permitam a inscrição de candidato que comprove
não ter condições de arcar com a taxa, em todo o território nacional,
indicando critérios objetivos para tal comprovação, sugerindo-se como critério
o limite de isenção do imposto de renda ou o disposto na Resolução do Conselho
Superior da Defensoria Pública da União n° 13, de 25 de outubro de 2006,
fixando-se multa diária pelo descumprimento da medida;
b) determinar à União Federal e à
Fundação Carlos Chagas que prorrogue as inscrições por mais vinte dias, em
todo o território nacional, o que
não inviabilizaria a realização da prova na data prevista no edital (11.02.2007),
divulgando de maneira ampla e célere a decisão, em todo o território
nacional, permitindo-se o conhecimento da
decisão por todos os potenciais candidatos que possam dela beneficiar-se e que
deixaram de inscrever-se no concurso em razão da impossibilidade de isenção de
taxa de inscrição, fixando-se multa diária, a critério do juízo, no caso de
descumprimento da prorrogação e/ou da divulgação
5. Dos
pedidos
Pelo exposto, a Defensoria
Pública da União requer:
a) a citação das demandadas para
apresentar defesa e acompanhar o -' presente processo, convolando-se em
definitiva a antecipação de tutela requerida - e obrigando as demandadas a
admitir inscrição de candidatos que comprovem sua hipossuficiência
independentemente do pagamento da taxa de inscrição;
b) caso a presente demanda seja
julgada improcedente, permitir-se aos eventuais beneficiários da antecipação da
tutela o pagamento da taxa de inscrição prevista no edital, convalidando-se a
inscrição sub judice;
c) a condenação das demandadas
nos ônus de sucumbência;
d) a produção de prova por todos
os meios em direito admitidos;
e) a intimação do Ministério Público Federal,
nos termos do art. 5°, § Ia, da L. 7.347/85;
f) a observância do prazo em
dobro, da intimação pessoal e da vista pessoal fora de cartório aos membros da
Defensoria Pública da União, nos termos do art. 44, I e VI, da Lei Complementar
80/94.
Dá-se a causa, o valor de R$
10.000,00 (dez mil reais).
São Paulo, 18 de dezembro de
2006.
JPCDORINI
Defensor Público da União
Defensor Público da União
(In Revista da Defensoria Pública da União, pág. nº 4, 2011