(Fluxo e Refluxo. Pintura do artista Ton MarMel)
Cada vez que um anúncio, uma
música, um filme, uma novela etc. são reexibidos, essa reprodução gera direitos
autorais a artistas e demais titulares desses direitos. Tudo deve estar
previsto num bom contrato, que deve conter o número de veiculações, os canais
de exibição, o território etc. No contrato, os atores, por exemplo, podem
exigir que a agência de propaganda ou produtora lhes dê conhecimento das
veiculações posteriores à realização do trabalho, creditando-lhes o
correspondente pagamento.
A mesma
lei que define e exemplifica o que são as obras protegidas, também estabelece
limites à proteção, isto é, menciona as obras que dispensam a prévia
autorização ou os modos de como o uso não constitui ofensa ao direito do autor.
É onde o interesse público predomina, embora interesses privados, muito em voga
na atualidade, a cada nova rodada de leis sobre o assunto, tentem reduzi-lo
cada vez mais.
São,
entre outros, exemplos de obras que podem ser utilizadas livremente em
decorrência de expressa isenção legal por refletirem mais os direitos de todos
(sociedade), à informação e ao conhecimento do que o direito individual do
titular: a reprodução de texto jornalístico, com referência à fonte (nome do
articulista e do periódico); a reprodução em jornais ou revistas de discursos
públicos; a reprodução, em um só exemplar, de trechos de obra publicada para
uso privado; a citação para fins de estudo ou crítica com referencia à fonte
(nome do autor e origem da obra); o apanhado de aulas e lições para uso pessoal
do aluno (nada a ver com apostilas); a utilização das obras nos
estabelecimentos comerciais que às expõem à venda. O uso de obras protegidas
para fim de paródias e paráfrase é livre, desde que não lhe impliquem
descrédito, isto é, que não atinjam a honra do autor, ou desqualifiquem a obra.
Neste ponto é preciso muito cuidado por parte de todos que orbitam em torno de
um problema dessa natureza, porque está em jogo a liberdade de expressão.
E,
finalmente, como já adiantado, há um campo de verdadeira imunidade a qualquer
proteção de caráter autoral: é o das idéias, dos conceitos, dos métodos, dos
sistemas, dos cálculos, dos projetos. O resultado material dessas idéias,
métodos etc., isto é, sua expressão fixada em base corpórea, concreta,
palpável é que é protegida pela lei autoral e não as idéias, os
projetos, os métodos, os cálculos em si. Exemplifica-se: o livro de ensino
de matemática é de criação de determinado autor, mas não os cálculos embutidos
em cada exercício. O direito autoral não cobre qualquer idéia ou conceito
existente por detrás de uma obra criada. A lei acrescenta ao campo da
imunidade os formulários, a reprodução de textos de lei e de decisões
judiciais, informações de uso comum como calendários, legendas e nomes, e
títulos isolados das obras. Aqui vigora o não-direito autoral, onde não há
propriedade de ninguém, onde podem todos transitar independentemente de
qualquer autorização. O contrário seria obstar o desenvolvimento das artes e da
ciência, o que não se concebe.
A
grande finalidade do direito autoral é a de incrementar a difusão da cultura e
do conhecimento, contemplando uma classe especial de pessoas, os artistas, os
cientistas, os pensadores, os criadores em geral, conferindo-lhes um
privilégio temporário para poderem explorar economicamente, e com
exclusividade, o fruto da sua criação. Esse privilégio, no entanto, está
limitado à obra criada, porque todos têm o direito de criar e, portanto, o
direito de usufruir cada qual do resultado de sua criação. Essa é a diferença
entre o monopólio e o privilégio. Se direito autoral fosse um monopólio, só o
primeiro escritor que tratou do triângulo amoroso poderia sobre ele escrever,
só o primeiro pintor abstrato, ou o criador das colagens, poderia criar obras
desse tipo, apenas o David Letterman, via CBS, poderia autorizar qualquer outro
artista ou meio de radiodifusão a entrevistar uma pessoa por vez, com música ao
vivo, tomando chá de canequinha...
Quando se fala em limites também significa que existem
coisas sobre as quais pode-se até tentar, mas não se vai obter a exclusividade
porque são de domínio comum. Piadas, receitas culinárias, modelos de roupa, por
exemplo, são todas obras derivadas de criações do espírito. Já imaginou se para
contar uma piada ou fazer uma nova receita de macarronada você tivesse que
pedir licença para alguém (o uso público de uma obra protegida está
condicionado à prévia e expressa autorização de seu titular, pessoa física ou
jurídica se os direitos foram negociados)? A humanidade ficaria reduzida à
tristeza e à fome, mesmo porque até descobrir o dono, e ainda pedir licença...
Assim,
impondo limites aos usuários dos direitos do autor, a Lei 9.610 (Lei sobre Direitos Autorais) ressalta in verbis que:
Art.
46. Não constitui ofensa aos
direitos autorais:
I — a reprodução:
a) na imprensa diária ou
periódica, de notícia ou de artigo informativo, publicado em diários ou
periódicos, com a menção do nome do autor, se assinados, e da publicação de onde foram transcritos;
b) em diários ou periódicos, de discursos pronunciados em
reuniões públicas de qualquer natureza;
c) de retratos, ou de outra forma de representação da imagem, feitos sob encomenda, quando realizada pelo proprietário do
objeto encomendado, não havendo a oposição da pessoa neles representada ou
de seus herdeiros;
d) de obras literárias, artísticas ou científicas, para uso exclusivo de deficientes visuais,
sempre que a reprodução, sem fins comerciais, seja feita mediante o sistema Braille ou outro procedimento em qualquer suporte para esses
destinatários;
II — a reprodução, em um só exemplar de pequenos trechos, para
uso privado do copista, desde que feita por este, sem intuito de lucro;
III — a citação em livros, jornais, revistas ou qualquer outro meio de
comunicação, de passagens de qualquer
obra, para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida
justificada para o fim a atingir, indicando-se o nome do autor e a origem
da obra;
IV — o apanhado de lições em estabelecimentos de ensino por aqueles a quem
elas se dirigem, vedada sua publicação, integral ou parcial, sem
autorização prévia e expressa de quem as ministrou;
V — a utilização de obras
literárias, artísticas ou científicas, fonogramas e transmissão de rádio e
televisão em estabelecimentos
comerciais, exclusivamente para demonstração à clientela, desde que
esses estabelecimentos comercializem os suportes ou equipamentos que permitam a
sua utilização;
VI — a representação teatral e a
execução musical, quando realizadas no recesso familiar ou, para fins
exclusivamente didáticos, nos estabelecimentos de ensino, não havendo em
qualquer caso intuito de lucro;
VII — a utilização de obras
literárias, artísticas ou científicas para produzir prova judiciária ou
administrativa;
VIII — a reprodução, em quaisquer obras, de pequenos trechos de obras preexistentes, de qualquer natureza,
ou de obra integral, quando de artes plásticas, sempre que a reprodução em si não seja o objetivo principal da obra nova e
que não prejudique a exploração normal da obra reproduzida nem
cause um prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos autores.
Art. 47. São livres
as paráfrases e paródias que não forem
verdadeiras reproduções da obra originária nem lhe implicarem descrédito.
Art. 48. As obras
situadas permanentemente em
logradouros públicos podem ser representadas livremente, por meio de pinturas,
desenhos, fotografias e procedimentos audiovisuais.
(Sublinha-se
e negrita-se).
(Ton MarMel)