(Coração de Ouro. Obra do artista Ton MarMel)
De plano, quanto ao registro de obras intelectuais, a
lei autoral assegura proteção aos direitos independente de qualquer
registro. Mas, a autenticidade de uma obra intelectual faz parte dos
direitos morais do autor em relação à sua criação e é
inalienável, irrenunciável, intransmissível e inconfundível; do contrário não
poderia ser chamada, sequer, autêntica.
Conseqüente natural do
processo criativo, a autenticidade é um dos direitos morais intrínsecos à
personalidade que existe a partir do ato
criador do ser humano em vida. É intransmissível
porque inerente à própria pessoa humana. É
inseparável da pessoa humana e é
irrenunciável durante a vida ou mesmo depois da morte.
A
autenticidade é um direito moral indisponível porque não pode
ser transferida, vendida ou doada, e apenas seu titular pode fruir. É irrenunciável porque sem ela a
própria personalidade desapareceria. É inexpropriável porque nem mesmo o Estado pode separá-lo do
indivíduo criador. É imprescritível porque não se
adquire ou se extingue pelo não uso; perdura
pelo tempo que perdurar, no mínimo, a MEMÓRIA e qualquer registro de
existência da obra.
Por isso, embora a lei não tenha premiado a autenticidade de obras
intelectuais dentre seu rol de definições, deve-se entender que se transmitem
aos sucessores e a qualquer outra pessoa detentora da obra, ou não, mas que demonstre legítimo interesse, o direito
moral de reivindicar, a qualquer tempo, o certificado de autenticidade de obra;
direito que tem o legítimo
interessado de ter o nome, sinal, marca, forma de expressão do autor
identificados, indicados, mostrados, evidenciados e anunciados, quando
utilizam, por qualquer meio ou modo, a obra que algum autor criou legitimamente.
Em verdade, é o
direito que tem o interessado de assegurar a integridade física da obra e moral
do autor, além da integridade
moral dele (interessado) no caso de ser detentor da obra; é o direito que tem o interessado de
exigir reparação pela ofensa física suportada pelo mau uso da obra e moral
suportada diretamente pelo autor da obra, com conseqüências diretas para ele,
interessado, enquanto detentor da obra, na hipótese de violação do
direito moral do autor.
De fato, a autenticidade independe de registro
formal para a existência porque a
autenticidade é inerente a verdade da união indissolúvel e continuada entre
criador e criatura; porque a autenticidade é a
genética da obra humana que revela sua autoria hereditária; porque a autenticidade está sempre
presente em toda obra humana originalmente criada, e ultrapassa os limites da
existência física da própria obra criada; porque toda obra originalmente criada tem sua autoria autêntica,
que pode ser certificada ou não por
algum meio ou processo; porque toda obra criada originalmente está
integralmente contida dentro da obra autêntica, e desta não se
desvincula jamais, mesmo que nunca se consiga saber quem foi seu autor; porque a autenticidade está, e pode ser
reconhecida, também, na maioria das obras derivadas que existem, mas
jamais uma obra derivada (resultante) será uma obra original; porque a autenticidade é verbo de ligação
atemporal que associa universalmente a criação do infronteiriço espírito humano
à pobreza finita do meio material.
Ante o exposto, sem dúvida, para viabilizar o
reconhecimento de autenticidade de obra post
mortem de seu criador, a providência
tempestiva do registro resulta, per si,
um certificado e meio de prova, tal qual sucede com as marcas e patentes
reguladas pela lei da propriedade industrial; objeto, como é, sujeito à evidência da prova material em contrário.
Assim, no Título II, no Capítulo III, Do Registro
das Obras Intelectuais, a lei traz os seguintes dispositivos, verbis:
Art.
18. A proteção aos direitos de que trata esta Lei INDEPENDE de
registro.
Art.
19. É FACULTADO ao autor
registrar a sua obra no órgão
público definido no caput e no § 1º do art. 17 da Lei nº 5.988, de 14 de
dezembro de 1973.
Art.
20. Para os serviços de registro previstos nesta Lei será cobrada retribuição,
cujo valor e processo de recolhimento serão estabelecidos por ato do titular do
órgão da administração pública federal a que estiver vinculado o registro das
obras intelectuais.
Art.
21. Os serviços de registro de que
trata esta Lei serão organizados conforme preceitua o § 2º do art. 17 da Lei nº
5.988, de 14 de dezembro de 1973.
(Sublinha-se, negrita-se e
destaca-se).
Por sua vez, embora a Lei nº 5.988, mencionada nos arts. 19 e 21 acima,
tenha sido expressamente revogada pelo último artigo da vigente lei sobre
direitos autorais (art. 115), neste mesmo dispositivo revogador a lei excetua
da revogação, dentre outros, o art. 17 e seus §§ 1º e 2º, os quais dispõem ipsis
litteris:
DO REGISTRO DAS OBRAS
INTELECTUAIS
Art.
17. Para segurança de seus direitos, o
autor da obra intelectual PODERÁ registrá-la, conforme sua natureza, na Biblioteca
Nacional, na Escola de Música, na Escola de Belas Artes da Universidade Federal
do Rio de Janeiro, no Instituto Nacional do Cinema, ou no Conselho Federal de
Engenharia, Arquitetura e Agronomia.
§ 1º Se a obra for de natureza que comporte
registro em mais de um desses órgãos, deverá ser
registrada naquele com que tiver maior afinidade.
§ 2º O Poder
Executivo, mediante decreto, poderá, a qualquer tempo, reorganizar os serviços de
registro, conferindo a outros órgãos as atribuições a que se refere este
artigo.
(Sublinha-se, negrita-se e
destaca-se).
Ante o exposto, deflui-se que o registro de obras
intelectuais, pela lei, é uma faculdade concedida ao autor, ou seja, é uma opção voluntária e um dos principais
meios de prova na eventual hipótese de dúvidas que possam recair sobre autoria
e autenticidade de obras. Não se podendo
admitir jamais a interpretação estrita de que o registro é desnecessário,
inútil, dispensável, obsoleto, escusável.
Além
disso, o registro serve, inclusive, como prova de anterioridade em relação à
obra idêntica que venha a ser publicada posteriormente por terceiros. Serve,
ainda, na menor das conseqüências, para se deixar gravado nos anais da
história a contribuição individual que se deixou para a cultura humana sem
maiores encargos ou dívidas a saldar.
(Ton MarMel)