(Matéria prima. Pintura do artista Ton MarMel)
Apesar da preocupação deste trabalho não residir na conceituação do que
seja obra de arte por quanto o tema é a abordagem da autenticidade de uma obra
intelectual, ou não, para auxílio ao Direito Autoral forense, não se pode
esquecer de que durante muitos anos se questionou, inclusive, se o próprio
Direito seria uma arte ou ciência. Portanto, sem retomar a ultrapassada
questão, necessário se faz abrir esta reflexão para que, através de breve
exposição, se possa ao menos perceber o que vem a ser uma obra de arte
conceitualmente, a fim de facilitar o entendimento do que seja uma obra
autêntica, que, adiantando,
necessariamente a expressão não é obrigada a referir-se tão apenas à obra
literária ou artística, podendo ser científica, inclusive.
Atribuir
um nítido conceito do que seja ou não arte não é fácil. Controverso e sem
sucesso foram os verdadeiros tratados e teses de estética que discorreram a
respeito. Mas, apesar disso, mesmo uma pessoa de conhecimento mediano, de
contato mínimo com a cultura urbana ocidental, se questionada sobre exemplos de
obras de arte talvez mencionará alguns exemplos de obras ou autores bem
conhecidos.
Sabe-se
que a Nona Sinfonia de Beethoven, que a Divina Comédia, que a Mona
Lisa, que Guernica de Picasso, que o Davi de Michelângelo,
que Hamlet, Otelo, Romeu e Julieta e outras obras de Shakespeare,
que o filme Casablanca, que o projeto de Brasília de Oscar Niemeyer e
Lúcio Costa, que Carinhoso de Pixinguinha, que Garota de Ipanema
de Tom Jobim e Vinícius de Moraes, indiscutivelmente, são, além de obras de
arte, artes reverenciadas no mundo inteiro.
Assim,
embora não se consiga expressar com clareza o que venha a ser uma obra de arte
autêntica, até porque o conceito depende de aspectos tais como o tempo, a
cultura e o próprio indivíduo que aprecia, é certo que se consegue identificar
alguns produtos culturais que ajudam a conceber uma mínima idéia do que venha a
ser “arte”.
Não
obstante o conceito de arte seja muito confundido e empregado erroneamente como
sinônimo de cultura e vice-versa, ressalta-se que a palavra cultura é gênero do
qual a arte é uma das espécies. E, mais, a palavra cultura merece ser vista
como um conjunto representativo de crenças, comportamentos, institutos e
valores materiais e espirituais transmitidos normalmente de forma coletiva,
contendo traços marcantes de uma sociedade, povo, raça, grupo humano.
Por
sua vez, de grosso modo, permite-se entabular que arte é manifestação de atividade humana que incita o olhar, a emoção, a
imaginação, o raciocínio ou todos os sentidos, membros e órgãos ao mesmo tempo,
e causa sentimento e reação, geralmente de admiração, mas que pode despertar,
inclusive, apatia ou até aversão dentro do mesmo grupo social, ao mesmo tempo.
Portanto,
do mesmo modo que a arte pode ser, estar e permanecer no meio material
empregado para sua composição, no
seu modo e maneira de feitura ou manifestação, é certo que a expressão artística pode estar simplesmente
exposta sobre ou abaixo da superfície de qualquer suporte material existente,
ou que se invente; do mesmo modo que é certo que ela pode ainda estar
simplesmente no conteúdo imaterial, não visível, não palpável. Mas, com certeza, estará dotada de
infindável energia em estado de hibernação à espreita do sensorial humano.
Daí a dificuldade de se
obter um conceito universal único a respeito do que seja uma obra de arte. Daí
a dificuldade que muitos têm em conceber como obra de arte um aparelho
sanitário de louça, idêntico ao de qualquer banheiro público masculino do
mundo, de Marcel Duchamp, ao compará-lo, por exemplo, com as pinturas do teto
da Capela Sistina de Michelangelo. Referencial, este, aceito e consagrado,
inclusive popularmente, como obra de arte autêntica, embora ambas as obras
pertençam a épocas distintas, foram criadas com propósitos completamente
diferentes, não percebíveis pela grande maioria do público, e, com certeza, até hoje, a maioria absoluta das
pessoas não gostaria de exibir na sala de visita de sua casa um vaso sanitário
igual ao de qualquer mictório do mundo, não importando quem tenha sido o autor
da obra.
(Ton MarMel)